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Enquanto há vida

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  Hoje caminhei mais uma vez em solitude. Uma caminhada difícil e necessária para tentar desafogar um pouquinho a alma de seus anseios e medos. Na minha utopia de vida, ninguém morre, sabe?! Sei lá, eu sempre espero que ninguém ao meu redor vá morrer. Sempre acredito que vá viver eternamente. Não que eu acredite de verdade nisso, mas a vontade está sempre ali, maior que a razão. Felizmente ou não, para a vida em si, continuar em frente é justamente efetivar o desaparecimento de alguém para que haja espaço para outrem. É da vida, dizem. Mas deveriam dizer “é da morte”. Mas sabemos que a utopia de todos é sempre reservada aos nossos próprios botões. É da nossa natureza sermos egocêntricos, fazer o quê? Assim como os escorpiões, não conseguimos evitar. Tá lá o morto estendido no chão, como dizia a música de Chico, mas ao passarmos por ele/ela, pensamos automaticamente: “ainda bem que não é ninguém que eu conheço”. Sempre tentamos preservar aqueles que nos são mais próximos, mais caros...

Aranhas

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Emaranhadas teias se estendem por postes e árvores — não é possível deter os olhos sem notar as garrinhas tenebrosas. São escuras ou transparentes; grossas, fininhas; feias, belíssimas. Podem ser potentes ou singelas e frágeis; enormes ou ainda um simples anel em volta de um pequeno botão de flor. No entanto, ao olharmos com mais vagar, sem tantos preconceitos, podemos perceber o quanto são imprescindíveis à natureza — e, especialmente, ao mundo atual. As luzes da cidade, tão lindas após o pôr do sol, escondem-se durante o dia entre frestas de fios emaranhados pelo tempo e pela falta de paciência dos homens. Às vezes, é até sombrio caminhar pela cidade que, com tantos encantos, parece não merecer tal afronta visual. Mas esses aglomerados, que à primeira vista parecem horripilantes, são capazes de nos deleitar em contemplação. Um mundo dentro de um mundo, dentro de um mundo… O que mais me intriga no universo das aranhas é justamente essa capacidade de se esconderem de forma tão enge...

Dores

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Nada na vida é de graça. Sempre que recebemos alguma coisa, a vida, inevitavelmente, nos cobra o retorno. Da mesma forma, sabemos que tudo o que damos — ou desejamos — ao outro, de algum modo, sempre retorna para nós. Hoje, ao caminhar pelo mesmo trajeto de sempre, sentindo intensas dores articulares, pensei muito sobre isso. Será que nossas dores, na maturidade ou na velhice, são o acúmulo das nossas ações ao longo da vida? Será que as dores que, por bem ou por mal, impingimos a outras pessoas voltam para nos assombrar quando nos aproximamos do fim? Ou seriam essas dores o reflexo de todas as vezes em que maculamos nossa essência? Quando dissemos “sim” ao que, no fundo, queríamos recusar. Quando nos deixamos arrastar para lugares e sensações que não desejávamos. Quando sonhamos com algo grandioso, mas desistimos por parecer pouco rentável — ou por medo da reprovação dos nossos pares. Há muitas teorias — psicológicas, filosóficas, médicas e espirituais — para as dores inexplicávei...

Pelas Janelas da Memória

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De tempos em tempos, precisamos de um pouco de aconchego e, por que não, de um tantinho de conforto ao nos deslocarmos pela cidade. Moro num lugar cheio de andantes, mas, numa cidade barulhenta, de carros buzinantes e motos ensurdecedoras, às vezes é preciso deixar de lado o prazer de caminhar e ocupar, com dignidade, nosso lugar de direito no transporte público. É fascinante entrar num ônibus. Sim, eu gosto! Mesmo quando ele está cheio de pessoas estressadas e cansadas ou com o ar-condicionado quebrado em dias de calor escaldante. Sempre há a chance de se aconchegar perto da janela e observar o mundo passar lá fora, ligeiro, como num passe de mágica. E, mesmo quando se viaja em pé, há aquela sensação meio boba — mas divertida — de estar numa montanha-russa sem cinto de segurança e sem hora certa para parar. É só você, a sorte de contar com um motorista experiente e calmo, e a esperança de pegar um trânsito razoável. É sério! Pode ser bem divertido, se você não estiver com pressa — e...

Companhia

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Foto:chatgtp/Tili Caminhar em solitude faz bem pra alma — mas nem sempre pro coração. Há momentos em que seguir ao lado de quem amamos, com quem escolhemos partilhar a vida, merece um cuidado mais demorado, mais presente. Seguir juntinhos, rindo, fofocando a vida alheia, falando dos filhos e suas miudezas cotidianas... ah, isso aquece até o coração mais atolado em cinzas. Hoje caminhei com meu amor de alma. Meu confidente, meu par na vida — inclusive nas causas perdidas. Nos atrasamos na saída... e que bom! Porque a espera de um pelo outro já se fazia desejo antigo. Nossa rotina, tão espremida entre os afazeres mecânicos e as poucas horinhas roubadas para uma série ou um filme, pedia — não, gritava — por mais tempo de cultivo desse amor que anda meio negligenciado pelos atropelos da vida. Os tempos andam sombrios, é verdade. Fumaças tóxicas rondam. O ar, curto. As doenças que batem nas portas das famílias. As mudanças físicas que o tempo vai desenhando nos corpos. E aquelas po...

Olhos em trânsito

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É possível caminhar com os olhos? Hoje me peguei pensando sobre isso, quando furtivamente olhava pela janelinha do transporte que utilizei para me locomover até o trabalho. Tenho sentido muita falta de minhas caminhadas matutinas, sempre em observação ao derredor e aos acontecimentos e detalhes impagáveis com que me deparava. Apesar do pouco tempo, a nostalgia é imensa. Sinto muita falta da incrível sensação dos raios solares em minha pele, dos ventos raros e refrescantes em meu rosto, do movimento das árvores deixando cair sobre mim suas pequeninas folhas, e até do cansaço ocasionado pelo calor do pequeno esforço com os quase dois quilômetros. Mas as vantagens do transporte hoje são muito grandes para que eu possa me dar ao luxo de abrir mão dele, e realizar uma caminhada que poderá me custar um tempo bastante produtivo de trabalho. Então… Está tudo bem! Eu só preciso de adaptação, só isso... Enfim, hoje vi que é um exercício bastante interessante, mas que exige técnicas de co...

Caminhar, salva!

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  Foto: Chatgpt Sabedora da dor de não caminhar, sou aquela que procura pelas brechas da vida algum momento em que meus pés possam, enfim, sentir o chão — e a gravidade agindo sobre ele. Muitas vezes me peguei pensando em como seria minha vida se algo acontecesse e eu não pudesse mais caminhar. Pois bem, nos últimos dias, em nome de um bem maior, foi preciso sacrificar meus momentos de caminhada em solitude. E, assim, nasceram pensamentos sombrios — e atitudes ainda piores. É provável, sim, que a terapêutica da minha caminhada faça diferença na personalidade que venho construindo ao longo dos anos — diabolicamente moldada, talvez, por uma genética caótica. Mas também é possível, ainda que soe como teoria conspiratória, que esses pensamentos e atitudes recentes estejam ligados ao cansaço do processo que vivemos em família, ou à alimentação desregulada. Afinal, é fato comprovado: o cérebro responde ao que o intestino absorve — vitaminas, nutrientes e o que mais vier. Enfim, o mistéri...